Duas opções discutiveis

Na última sexta e subsequente fim de semana, a Montis executou acções de gestão que deram origem a alguma controvérsia. aliás no seguimento de discussões anteriores.
A primeira, na sexta feira, o fogo controlado que, nesta fotografia do João Cosme, ainda está na sua fase inicial.
Pode ver-se que o fogo começa junto à faixa de contenção e contra o vento (o fogo vai progredir para a esquerda, para o interior da zona delimitada pela faixa de contenção e as plumas do fumo estão inclinadas para a direita), de cima para baixo, para que o fogo seja feito com as características que se pretendem.
Há razões muito claras para o fogo ser feito assim, nesta altura do ano, e não de outra forma qualquer: os efeitos do fogo na vegetação e no solo dependem muito da intensidade do fogo, isto é, da temperatura que vai ser atingida na sua progressão.
Neste caso em concreto, porque grande parte da área a queimar era um giestal que arde dificilmente nesta altura do ano (ao contrário do que acontece nos fogos de elevada intensidade do Verão, em que se comporta como um autêntico rastilho, ardendo rápida e intensamente num fogo de copas incontrolável e com dezenas de projecções), as condições do fogo tiveram de ser um equilíbrio difícil entre a intensidade necessária para que progrida e atinja os objectivos e a intensidade mais baixa possível para que queime apenas o que se pretende, com o mínimo de efeitos sobre o solo e sobre as raízes das plantas.
Sobre este fogo se fará um post específico e sobre a controvérsia a única coisa relevante é relembrar que a opção não é entre queimar ou não queimar, a opção é entre queimar assim, em áreas definidas, com intensidade de fogo baixa, com temperaturas que maximizam a disponibilização de nutrientes no solo, com velocidade de propagação que permitem à fauna fugir ou abrigar-se, com temperaturas no solo que preservam grande parte da sua capacidade biológica, imediatamente antes de uma chuva que irá permitir uma rápida cobertura do solo, ou arder num Verão qualquer, com intensidades e temperaturas excessivas e sem qualquer possibilidade de controlo.
A segunda controvérsia, menos visível mas muito presente nos voluntariados, é a opção pela plantação de árvores com densidades muito elevadas, com um compasso próximo do metro a metro.
Esta opção é muito pouco usada em Portugal e incompreensível para quem pretenda fazer florestação de produção.
A densidade de árvores impede a mecanização das operações florestais, pode conduzir à atrofia de muitas árvores, implica uma muito maior competição pela água, nutrientes e luz, enfim, aparentemente uma má opção para se obterem boas árvores no mais curto espaço de tempo.
A fundamentação para a Montis fazer esta opção está no facto do foco da Montis ser a recuperação da paisagem e não a maximização da produção florestal.
O que queremos, o mais rapidamente possível, é obter núcleos de ensombramento que controlem o crescimento dos matos, introduzindo diversidade estrutural e de nichos ecológicos. Para além de darmos, nesta propriedade, uma importância muito grande ao aumento de fontes de sementes diversas, dada a monotonia de que partimos, com a esmagadora dominância do giestal resultante de abandono com ciclos de fogo entre os dez e os quinze anos.
Esta opção tem ainda a vantagem de permitir uma melhor defesa destes núcleos em relação ao fogo visto que ao concentrarmos a plantação tornamos gerível a abertura de faixas de contenção que mantenham o fogo controlado fora das áreas de plantação nos primeiros quatro a oito anos. Depois desse tempo, mesmo ardendo, estes núcleos mantêm-se porque os indivíduos são resistentes aos fogo, em especial ao fogo de baixa intensidade.
Há ainda um resultado que é usado na silvicultura comercial e que para nós não é muito relevante, numa primeira fase: a elevada densidade obriga as árvores a competir pela luz, crescendo mais em altura, o que dá origem a fustes mais altos e direitos. Na silvicultura comercial esta opção vai dando origem a desbastes ao longo do tempo, necessidade que avaliaremos a seu tempo.
A controvérsia e a discussão são muito úteis porque nos obrigam a pensar, a avaliar o que sabemos, a estar com muita atenção aos resultados.
E se, em relação ao fogo controlado temos já um ano sobre o primeiro fogo, que desmente os preconceitos sobre a destruição do solo e da sua cobertura como resultados inevitáveis do uso do fogo (esta área ardeu há um ano no fogo controlado e é perfeitamente visível, quer na baixa em primeiro plano, quer na encosta, em segundo plano, uma excelente cobertura do solo),
em relação ao uso de plantações de elevada densidade vamos ter de esperar mais dois a três anos antes de termos indicações fiáveis sobre se os resultados esperados estão a ser atingidos.
Até lá iremos continuar as acções de gestão, quer estas (as plantações estão a acabar por este ano e o próximo fogo controlado só está programado para o próximo Outono), quer todas as outras que geram menos controvérsia: 1) acções de engenharia natural para reduzir a velocidade de escorrência da água, permitindo a acumulação de solo e a retenção de humidade; 2) acções de condução da regeneração natural, que se vão intensificar depois da Primavera nos indicar o caminho; 3) acções de sementeira directa quando seja a época adequada e se justifique; 4) acções de manutenção do acesso para que todos possamos ir, ver e avaliar; 5) acções de controlo de invasoras quando necessário, etc..
Para já temos a sensação de que mudámos o destino destes cem hectares e a forma como irão evoluir. Amanhã não sabemos, teremos de ver, a seu tempo.

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