A sombra do dono é que faz crescer a vinha

No dia 23, Sábado, havia Assembleia Geral e decidimos organizar uma visita aos terrenos comprados no primeiro crowdfunding da Montis, um ano e meio depois do fogo em que arderam.
A ideia central era permitir que os donos, isto é, os sócios da Montis, pudessem ver onde estavam aplicados os recursos que entregam à Montis e discutir alternativas de gestão.
O modelo de passeio foi bastante original para os padrões da Montis e por isso a discussão acabou encurtada, mas isso permitiu que os cerca de 15 participantes se concentrassem numa questão relevante e que é, neste momento, a dominante naquela propriedade: o que podemos fazer para estar nas melhores condições no próximo fogo?
Não foi possível, ainda, correr toda a propriedade executando as acções de gestão que estão definidas para ali.
O aspecto geral das áreas a que ainda não conseguimos chegar é o desta fotografia: uma boa cobertura do solo, uma boa regeneração, parte por rebentação de pé, por exemplo carvalhos, tojo, urze, parte por germinação de semente, em especial no caso da giesta.
A situação desta encosta antes do fogo era a de um giestal com carvalhos imersos e competindo por espaço e luz, sem diferenciação de alturas.
O fogo, demasiado intenso para permitir a rebentação de copas dos carvalhos, obriga a um recuo na recuperação do carvalhal, mas dá-lhe uma vantagem temporária: com a raiz intacta, a rebentação de pé do carvalhos é mais rápida que a germinação de semente das giestas.
Este é o ponto de situação das áreas sem intervenção pós-fogo e os carvalhos têm este aspecto, sugerindo que já em fogos anteriores esta rebentação de pé existiu, dando origem não a um tronco, mas a vários troncos do mesmo carvalho, que se desenvolvem a partir da mesma raiz.
Nesta situação a vantagem temporária dos carvalhos sobre as giestas desaparece em dois três anos, ao fim dos quais voltamos à massa de vegetação quase indistinta em que coexistem giestas altas, urzes, tojo e carvalhos, criando condições para os violentos fogos de copas que ocorrem em períodos que variam entre os dez e os quinze anos, mais ou menos.
A cada um destes ciclos o carvalho ganha uma pequena vantagem, mas demorará muito até que as suas copas dominem os matos e comecem a criar sombra suficiente para controlar giestas, urzes e tojo.
O que fizemos no ano passado, e agora iremos continuar, quer intervindo nos carvalhos que fomos deixando para trás, quer melhorando a intervenção nos carvalhos a que seleccionámos duas a quatro guias no ano passado, pode ser visto nesta fotografia
Aqui é bem visível que ao eliminar a maior parte das guias que nasciam do pé, no ano passado, o carvalho concentra o seus desenvolvimento nas duas a quatro guias que deixámos - não quisemos selecionar uma nessa altura para que a superfície de folhas não diminuísse muito para repor as reservas que a raiz tinha gasto a refazer a copa entretanto ardida - e as guias estão muito mais altas e muito mais grossas, já quase da altura de uma pessoa. Este ano vamos escolher apenas uma, a que nos parecer melhor.
Com isto aumentamos a vantagem que o carvalho ganhou com o fogo, diminuímos o tempo necessário para que as copas fiquem acima do mato, e diminuímos o contacto entre o mato e a copa do carvalho - o que vamos acentuar mais tarde desramando os ramos mais baixos - aumentando a probabilidade do fogo de chão não se propagar à copa num incêndio futuro.
Nesta propriedade, com bastantes carvalhos instalados, a condução destas árvores para que ganhem altura e ganhem a competição com os matos é a trave mestra da intervenção, sempre com a mesma ideia que temos na generalidade dos terrenos que gerimos: criar paisagens que convivam serenamente com o fogo, com mais diversidade e mais agradáveis de ver ou usar, procurando ir buscar à natureza o conhecimento em que assentam as acções de conservação que fazemos.
E é ao ver isto, ao trazer os donos ao terreno para que vejam o destino do dinheiro que é entregue à Montis, ao sentir que há a ideia de que estamos a andar no caminho certo, que reforçamos a convicção de que a compra de terrenos é a forma mais segura de fazer conservação da natureza.
E, naturalmente, insistimos na fórmula: um euro é um euro e no conjunto das pequenas doações resultantes desta campanha vamos aumentar para mais do dobro a área propriedade da Montis, com a sua ajuda, claro.
henrique pereira dos santos

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