Um passo na direcção certa

Ontem foi um dia intenso para Montis, com a terceira queimada prevista no nosso plano de fogo controlado.
Não conseguimos tudo o que queríamos, apenas conseguimos queimar por volta de 15% da parcela.
Sabíamos que a vegetação dominante era difícil de fazer arder num fogo controlado, por ser essencialmente giesta alta e densa, sabíamos que as condições meteorológicas eram adequadas, mas não as mais fáceis porque não havia vento, e sabíamos que a humidade dos combustíveis e atmosférica estava no limite.
Este Outono e Inverno tem sido parco em janelas de oportunidade para a queima controlada, nós queríamos queimar nesta altura porque as outras duas queimas foram em Fevereiro e queremos avaliar as diferenças de resposta da vegetação a queimas feitas em diferentes épocas, de maneira que, mesmo correndo o risco que se veio a materializar, queríamos tentar.
O balanço é, no entanto, muito positivo, mesmo não tendo sido possível queimar mais que 15% do que queríamos.
Estritamente do ponto de vista de gestão da queima, foi possível reforçar muito a segurança nas estremas da parcela, isto é, o que se faz, num fogo controlado, é definir uma área da qual se pretende que o fogo não possa sair, o que se consegue criando uma descontinuidade na vegetação que pode arder.
A Norte da parcela está um caminho florestal largo, portanto está estabelecido um limite, apenas com a dificuldade que decorre das acções de prevenção dos fogos que foram executadas pelo ICNF, às quais a Montis é alheia: mato cortado numa faixa de alguns metros, mas mantido no local, o que significa uma enorme facilidade em arder, na medida em que em vez de termos um limite de arbustos vivos, com bastante humidade, temos um limite de arbustos mortos e secos, prontos a arder.
Nos restantes lados foi preciso abrir faixas de contenção, isto é, assegurar uma distância de dois metros entre copas dos arbutos ou árvores do lado a queimar e do lado fora do fogo controlado, a que se soma a necessidade dos trinta centímetros centrais estarem limpos até ao solo para que o fogo não passe de um lado para o outro, pelo chão.
Dependendo das características da vegetação, mais fechada ou mais aberta, e da topografia, com maior ou menor dificuldade em ter uma faixa bem definida, estas faixas garantem melhor ou pior a segurança da queima na medida que em asseguram que o fogo não saia da área que se pretende queimar.
Como é natural, se foi preciso abrir estas faixas, foi preciso cortar material que se vai depositando para o lado de dentro da parcela a queimar, fazendo com que existam arbustos mortos que aumentam a intensidade do fogo, exactamente onde se pretende assegurar um limite para a sua progressão.
Controla-se o fogo escolhendo a área que arde, escolhendo as condições meteorológicas em que arde e controlando parcialmente a intensidade do fogo através das ignições, escolhendo, através da forma e local das ignições, a forma como o fogo progride.
O que se conseguiu ontem, e que é bastante importante como primeiro passo para queimar os restantes 85% da parcela, foi reforçar a segurança da queima porque se fez arder todo o perímetro da área a queimar, reduzindo muitíssimo os riscos associados à próxima queima.
Por essa razão, a queima vai poder ser feita em condições que resultam num fogo mais intenso (o que chamam queimar no limite superior da prescrição, para os que estão habituados a esta linguagem), a favor do vento Leste (o que é facilitado pelo facto de a Poente estar a parcela que queimámos na Primavera de 2018, o que garante bastante segurança em relação a eventuais projecções) essencial para queimar um giestal denso e alto, sem material morto por baixo que permita a progressão do fogo pelo chão. Isso foi particularmente evidente ontem: os dez a vinte por cento que conseguimos queimar resultaram de um ou outro momento de algum vento, mas sobretudo de haver algumas áreas com maior diversidade, em que algumas urzes, carqueijas e tojos permitiram que o fogo progredisse, morrendo assim que entrava no giestal.
Em primeiro plano uma área que se conseguiu fazer arder, ao fundo, o limite Norte, a partir do caminho florestal, que se conseguiu queimar numa faixa de alguns metros com material seco proveniente das acções de prevenção do ICNF, no plano intermédio o giestal, com algum salgueiro indicando uma baixa com maior humidade, em que o fogo morria sem progredir. Note-se, como é normal nestas circunstâncias, que a queima está a ser feita contra o vento e de cima para baixo, para controlar a intensidade e a progressão numa faixa de maior risco
Com a próxima queima feita em condições que implicam maior intensidade do fogo, espera-se uma maior afectação da vegetação, um maior consumo dos combustíveis finos e também melhores condições de intervenção pós fogo numa parcela que parece estar a revelar maior potencial que o que se estimava antes (o fogo já permite o acesso a novos pontos de vista, que nos dão uma visão mais pormenorizada do que está a acontecer).
Quatro anos depois, quando voltarmos a repetir a operação de queima, esperamos que tudo seja bem diferente, com a diminuição da dominância da giesta e o seu menor desenvolvimento, com menor acumulação de combustível, com maior diversidade da vegetação propiciada pela entrada de luz até ao chão. E também com o efeito das operações de gestão que faremos até lá, incluindo a escolha dos melhores locais para a instalação de alguns bosquetes (por gestão da regeneração natural, sementeira directa e plantações) que, provavelmente, serão apartados da área a queimar através da gestão da vegetação nos seu perímetro.
Oito anos depois, no terceiro fogo controlado nesta área, esperemos que tudo seja bem diferente, já com pequenas árvores que resilientes ao fogo, quer porque têm essa característica, dentro de limites, quer porque as vamos preparar para isso.
Tudo isto, naturalmente, se não vier, entretanto, um fogo selvagem de Verão, como é provável (o último foi há oito anos, portanto estamos a entrar no período de retorno normal naquelas circunstâncias, em torno dos doze anos), circunstância em que a operação de queima, que vamos concluir logo que haja oportunidade para isso, desempenhará um duplo papel: a) permite ao dispositivo de combate usar esta faixa de redução da intensidade do fogo como uma oportunidade na sua estratégia de controlar o fogo; b) quer suceda isto, quer não, a redução da intensidade do fogo determinada pela diminuição dos combustível disponível permite uma menor afectação da vegetação e o do solo, o que garante uma recuperação pós fogo bastante mais rápida, permitindo a criação de um mosaico de nichos ecológicos no pós fogo em detrimento de uma extensa área homogénea de afectação mais profunda da vegetação e do solo.

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