Nota: como naturalista sou um autêntico zero à esquerda, todas as identificações deste post devem ser lidas tendo isto em atenção, embora, de maneira geral, eu recorra a muitos dos meus amigos quando qualquer coisa me chama a atenção. Só que os meus amigos estão limitados pelas descrições que faço e quem não sabe é como quem não vê: frequentemente não registei a informação relevante para a identificação
Fui dar uma volta por terrenos geridos pela Montis, agora que não tenho muito mais responsabilidade no assunto que pagar os meus 20 euros de quota anual. Como não gosto de gastar dinheiro mal gasto, fui ver se os meus vinte euros anuais eram bem gastos.
A caminho de uma das propriedades das propriedades de Vermilhas tirei esta fotografia por me parecer que seria o que normalmente veria sem intervenção depois do fogo de 15 de Outubro de 2017: carvalhos com a parte aérea ardida e uma abundante rebentação de pé que se irá desenvolvendo até ao próximo fogo, tipicamente resultando em carvalhos com meia dúzia de troncos a partir da mesma raíz.
O meu objectivo era comparar com estas fotografias já na propriedade gerida pela Montis
A diferença, por enquanto, não parece muita: há uma ou duas varas que foram sendo seleccionadas nos dois anos anteriores e que se destacam, embora continue a haver muita rebentação de pé que terá de ir sendo eliminada.
Espera-se que ao longo dos anos, até ao próximo fogo, este favorecimento contínuo de algumas varas se vá reflectir num crescimento mais rápido dos carvalhos em altura.
Pretende-se que este aumento de velocidade do estabelecimento do carvalhal já permita um controlo de matos e uma distância das copas dos carvalhos ao chão que altere as características do fogo que ocorrerá mais ou menos daqui a dez anos, aumentando a probabilidade da rebentação de copa e uma recuperação mais rápida após o fogo.
Se se verificar que assim é, estaremos a encurtar bastante o tempo até ao estabelecimento de carvalhais maduros.
Claro que ainda há muito trabalho a fazer, como se pode ver por estas fotografias.
Os esqueletos dos carvalhos que arderam em Outubro de 2017 lembram-nos o ponto em que estávamos, irão caindo com o tempo, mas até lá todo o sistema continua a produzir biodiversidade, seja o noitibó (Caprimulgus europaeus) que levantou dois metros à minha frente quando por lá andava, seja dos invertebrados e dos fungos que por lá vão estando.
Depois da visita a esta propriedade, que já justificaria os meus vinte euros anuais de quota, ainda passei por Levides, que não conhecia e onde há um potencial de recuperação muito interessante, e na Cerdeirinha em que o trabalho de condução da regeneração natural parece estar a ter resultados bem catitas, sobretudo se pensarmos que esta é apenas a terceira Primavera depois dos fogos de Outubro de 2017.
Faltava a prova real: ver o que está a acontecer no baldio de Carvalhais, uma propriedade bem mais difícil de gerir, quer pela dimensão, quer pelo ponto de partida, quer pelas características biofísicas, quer ainda pelos problemas relacionados com javalis, coelhos, pastoreio, etc., que condicionam os resultados.
Tem estado uma Primavera fantástica e tropeça-se constantemente em coisas bonitas, como estes miosótis (em princípio, Myosotis welwitschii, mas dizem-me que só com a planta na mão é que se poderia confirmar).
A quantidade de invertebrados por todo o lado é enorme, incluindo os abelhões com o seu barulho constante (notei que o bombus que vi não parecia, aos olhos de quem olhou para umas fotografias péssimas que tirei, que não seria o mais vulgar bombus terrestris, demasiado branco e não amarelo, mas outro que não sei identificar), e esta Primavera parece estar a correr de feição.
Como sempre, naquela zona, lá vou olhando para os dejectos, e quando num cruzamento vi qualquer coisa que me parecia ter bastante pêlo de javali, lá fotografei para perguntar se havia alguma hipótese de ser de lobo. A hipótese não pareceu absurda, mas estava tudo muito degradado para valer a pena recolher e mandar para análise genética, um dia alguém vai confirmar um dejecto de lobo naqueles caminhos, é quase de certeza uma questão de tempo.
Sempre achei graça a estas plantas que se instalam no meio dos penhascos, como esta vulgaríssima Umbilicus rupestres ou que se encontram no meio de coisa nenhuma como esta igualmente vulgar Linaria triornitophora
Confesso que os meus interesses são na verdade outros, como ver como estava a evoluir a área do primeiro fogo controlado, agora que estaria planeado um novo fogo na próxima época de Outono/ Inverno, quando fará quatro anos que foi queimado pela primeira vez.
Meio a custo, lá se vê um carvalhito ou outro, às vezes uns salgueiros, que talvez seja boa ideia preservar um bocado desse fogo controlado, criando uma pequena faixa em volta, com pouco combustível, favorecendo o seu crescimento e permitindo que, tão cedo quanto possível, produzam bolotas – não os salgueiros, claro – que permita aumentar a velocidade da recuperação dos carvalhais numa zona em que claramente falta regeneração natural de árvores.
Por agora, é muito evidente a separação entre essa área que queimámos há três anos e meio e a área que não ardeu ainda, que nesta fotografia está marcada pela diferença de tom de verde, mais próximo um verde mais aberto e mais diverso, mais ao fundo o verde meio acinzentado do mar de giestas.
É bom verificar que se conseguiu ir retendo solo, aumentar a fertilidade e melhorar as condições para uma futura evolução mais rápida nas zonas de baixa. É impressionante a rapidez de evolução que este gabião permitiu.
A questão das plantações de árvores é uma questão difícil para a Montis, nomeadamente nesta propriedade.
A Montis sempre preferiu apoiar os processos naturais, usar sementeiras, apoiar a regeneração natural, mas aceitou trabalhar com a Mossy Earth num programa de plantação de árvores.
Actualmente esse programa não está activo por causa da baixíssima taxa de sucesso das plantações, em parte por causa da seca, em parte porque o terreno é difícil, em parte pela opção da Montis não ter optado por aumentar essa taxa de sucesso com investimento em protectores, regas e outras técnicas que se consideraram excessivamente consumidoras de recursos.
Mas há sempre quem resista, mesmo que apenas sobrevivendo, sem crescimento, à conta dos coelhos e das cabras.
Lá se vai aguentando à espera de melhores condições.
É claro que é frustrante encontrar plantações totalmente devastadas por javalis.
Mas também é um gosto quando se encontram os raros exemplos dos que se safaram, até agora.
Não deixa de ser uma satisfação olhar para esta área, que era um giestal monótono, com plantas de quatro a cinco metros de altura, solo praticamente nu por baixo do giestal denso, e ver como agora, pouco mais de um ano depois da primeira queima, a diversidade é maior, ainda que sem grande interesse para já, mesmo que seja possível tropeçar em lagartos de água (Lacerta schreiberi, foi pena ser uma fêmea, que os machos são bem mais bonitos).
Tal como é estimulante olhar para este pequeno retalho de pinhal que os sócios da Montis foram conduzindo, numa zona em que a regeneração do pinheiro era intensa, esperando que venha a fazer parte de um mosaico bem mais diverso do que se encontrou quando a Montis começou a gerir este bocado de baldio que nos foi entregue.
Resumindo: para já, os vinte euros por ano de quota estão a dar-me um grande retorno em satisfação, se a coisa continuar assim, não há razão para deixar de pagar quotas.
henrique pereira dos santos
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